2.ª Conferência: Da New Age ao pragmatismo Cristão: Os desafios da fé

1. Introdução à New Age.

Este movimento religioso moderno pode ser definido nos seguintes termos: «proposta de uma cosmovisão sincretista e eclética – em relação a diversas tradições culturais e autores – de toda a realidade, apresentada como uma nova consciência integral ecológica e holística que, sem um corpo doutrinal preciso e homogéneo, encontra na dimensão religiosa o seu maior florescimento como expressão de uma espiritualidade panteísta, cósmica e imanente» (J. A. Nistal e J. C. Gil).

1.1. Características da New Age: pode ser considerado como um movimento religioso que se define pelas seguintes notas:
1.1.1. Holística: considera todas as coisas como unidas num grande todo em que todos os elementos comunicam entre si.

1.1.2. Ecológica: a terra (Gaia) é considerada como sendo uma realidade dotada de vida própria, sensível e inteligente.

1.1.3. Andrógena: tudo é simultaneamente masculino e feminino.

1.1.4. Mística: redescoberta do sentido religioso e divino em todas as coisas quotidianas.

1.1.5. Mundial: todos os indíviduos devem tomar consciência da dimensão mundial, integrando-se no todo que é a humanidade.

1.2. Princípios doutrinários da New Age.

Muito embora se considere Paul Le Cour como o fundador da New Age, nomeadamanete com a publicação, em 1937, de A Era do Aquário, o movimento ganha um novo e decisivo impulso com as pretensas revelações feitas a Alice Bailey, em 1945, por uma personagem que recebe tanto o nome de O Tibetano como o Cristo e que lhe propõe, no rescaldo da segunda Guerra Mundial, um movimento com um triplo objectivo: uma nova ordem mundial, um novo governo mundial e uma nova religião mundial.

1.2.1. O regresso ou reencarnação de Cristo. Cristo regressa á terra e tem uma tripla missão a realizar: ele é o integrador do triângulo poder-amor-luz; é o novo dispensador da água da vida (signo do aquário); e o apoio dos que procuram uma consciência e iniciação superior.

1.2.2. O arco-íris é o símbolo da auto-salvação, porque simboliza a ponte de luz que se estabelece entre a consciência que o indivíduo tem de si mesmo e o divino nele mesmo; por esta via de luz penetram as energias espirituais e divinas na ida diária transformando-a, de modo análogo a como conteceu em Cristo.

1.3. Crítica teológica da New Age. Este movimento religioso é o resultado de uma síntese de elementos judaico-cristãos, orientais e gnósticos. De certo modo, pode ser considerado como um novo gnosticismo, que procura uma nova síntese entre as grandes religiões e a ciência, ao mesmo tempo que, partindo do cepticismo kantiano, que nega a possibilidade de conhecer a realidade em si mesma, afirma-se como elativista e anti-racionalista.

Não obstante a sua pretensão científica, a New Age recorre a uma mística moderna totalmente anti-racionalista: como Deus não pode ser conhecido, deve ser experimentado. Não é contudo um ser pessoal, mas a nergia intelectual que domina o universo. Neste sentido, a religião é a superação do indivíduo no retorno à dança cósmica do universo, a identificação do eu com o cosmos, com a totalidade. Enquanto o conhecimento objectivo é limitativo e redutor, a eliminação dos limites do eu e o regresso ao todo é redentor e libertador. O modo como se propõe esse regresso às origens é também significativo: a ascese não se processa por via do conhecimento e da razão, mas pelo sentimento e a paixão, nomeadamente pela música e pela dança, que embriagam os sentidos na dimensão do infinito. Para este efeito, a New Age propõe o regresso às religiões pré-cristãs, na medida em que dominam técnicas que facilitam essa embriaguês dos sentidos: só a experiência de um prazer infinito pode libertar o homem da calamidade da sua condição finita.

2. O moderno pragmatismo eclesial.

Bento XVI designa este comportamento de uma forma particularmente significativa e crítica: «o pragmatismo cinzento da quotidianidade eclesial». Refere-se principalmente a dois aspectos que importa ressaltar:

2.1. O princípio da maioria em matéria de fé e de moral. É uma opinião muito generalizada entre os fiéis a ideia de que só aquilo que a maioria entende como sendo vinculante pode ser proposto pela Igreja como tal. Contrapõe Bento XVI: «uma fé que nós podemos determinar e fixar não é de modo algum uma fé». Om efeito, ou a fé procede de Deus através da sua Igreja e dos seus sacramentos ou então, pura e simplesmente, não existe. Subjaz a este entendimento uma lógica de poder: o princípio da maioria é um princípio de natureza eminentemente política que não tem qualquer fundamento evangélico (pelo contrário, recorde-se a reacção de Cristo ante o abandono e muitos dos seus discípulos – cfr. Jo 6, 66-71; ou, ainda, a sua condenação à morte a pedido de uma enfurecida multidão, etc.).

2.2. A liturgia. As diferentes reformas litúrgicas levaram a crer que os ritos da Igreja são opináveis e que, por isso, cada qual pode celebrar os mistérios da fé como melhor entender. Com efeito, se o Papa pode mudar o modo de celebração da Missa, porque não o podem fazer também os Bispos nas suas dioceses? E, se estes o fazem, porque não também os presbíteros nas assembleias a que presidem? Mais ainda, os próprios fiéis em comunidade podem sentir a necessidade de ultrapassar determinadas fórmulas litúrgicas e enveredarem por uma liturgia da vivência que, em certo sentido, poderiam ocasionar experiências pseudo-místicas equivalentes às propostas pela New Age e movimentos afins.

A este propósito interessa contrapor que a Igreja é simultaneamente hierárquica e carismática: a autenticidade das graças que Deus concede à sua Igreja verifica-se pela sua aprovação pela autoridade eclesial competente. Por outro lado, a liturgia não tende a provocar nos fiéis estados de ânimo mais ou menos gratificantes, mas em proporcionar-lhes o acesso à graça de Deus, quer pela via dos sacramentos, quer pelas práticas de piedade ou outros exercícios cristãos. Uma praxis eclesial que em vez de ser culto do Criador procurasse ser essencialmente satisfação da criatura seria idolátrico, porque o sagrado teria sido substituído pelo próprio homem, que dessa forma prestaria culto a si mesmo.


9 de Abril de 2008.

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